Temas diversos


Aula do corpo
Por Rodrigo Noronha

Com é focado o corpo na escola de hoje? Qual a sua importância no processo cognitivo de cada aluno? Existe pensamento sem sinapses?
Primeiro problema é a polissemia da palavra corpo: o corpo da palavra, o corpo de bombeiros, o corpo da escola. Emprego aqui a noção de corpo físico tão negligenciado pela nossa cultura ocidental. Desapego este que se reflete na sala da aula quando priorizamos uma educação mentalista em detrimento do corpo como algo menor e em função da verdadeira força motriz que seria o pensamento. O corpo na escola fica relegado a atividades esportivas ou lúdicas sem muito aprofundamento de sua real participação no processo cognitivo.

Novas descobertas em neurobiologia estão demonstrando a importância de se resgatar nossa animalidade (corpo), realçando o papel decisivo das emoções e sentimentos na formação das imagens que internalizamos e que são responsáveis por aquilo a que costumamos chamar de pensamento, mente ou qualquer outra universalidade que criamos. Aprofundei mais nas teorias de Antônio Damásio e Humberto Maturana. Poderia citar Francisco Varela, George Lackoff e Mark Jhonson, Rodolfo Llinás dentre muitos.

Para eles o corpo não é mais instrumento da mente, corpo sujeito a uma ordem ulterior para só então se manifestar através de uma ação. O corpo não é passivo e a capacidade de pensar surge da interação inexorável entre corpo e mente. O corpo está nesta mediação com o meio e o pensamento surge de nossa necessidade animal na busca da preservação deste corpo físico não só para sobrevida, mas para o bem estar deste corpo físico. Cada vez mais o homem está repensando alguns conceitos de sua cultura que se destaca do corpo e da natureza.
A escola normal está na base da formação deste indivíduo. Portanto tornar-se-ia necessário repensar o corpo na escola. Qual a relação entre movimento e cognição? Já reparou que os seres pensantes são os que se movimentam?

Crio o exemplo que pode ilustrar esta interação entre mente e corpo. Imagine-se perdido em uma floresta seguindo por uma trilha, de repente em uma curva adiante depara-se com um lobo. Cada um sai correndo para um lado com medo do outro. A sensação de medo (no lobo também) descarregou adrenalina, arrepiou os pêlos e outras alterações de estados do corpo. Estas alterações (emoções) serão registradas pelo cérebro como imagens associadas aos estados corporais e cenários que a despertaram. Na próxima curva já antevejo a possibilidade de uma lobo e a emoção e todas as alterações, aparecem antes mesmo da presença ou não do lobo. Esta antevisão são os sentimentos. As imagens que guardamos se fundem em novas imagens permitindo ainda mais o poder de antever e solucionar situações indesejáveis ou desejáveis. Esta capacidade dá origem ao pensamento e o corpo está na gênese desse processo.

Quando se fala do corpo na escola, a primeira imagem que vem é a área da Educação Física que, por mais que se venha reformulando com seu conceito de cultura de movimento, ainda possui práticas muito competitivas e exclusivas de corpos não preparados para o exercício. Será que a competição não é algo que desagrega, favorece o individualismo em detrimento do grupo? Mesmo que digam que o jogo é por equipe, é sempre um contra outro e dentro da própria equipe há competição. Será que a competição é algo da natureza do homem ou o ser humano sobreviveu pela sua necessidade de grupo?

Na Aula do Corpo busca-se movimentos que partam do próprio aluno e que tenham a capacidade de despertar emoções, sentimentos e imagens associadas evitando qualquer tipo de competitividade e execução de movimentos pré ordenados. Estimula-se a vontade de grupo, as diferenças e a criatividade.

Uma escola que se preocupa com o futuro não só dos seus alunos, mas de toda nossa organização social, teria que repensar o conceito de competição tão enraizado em seus quadros. Pode ser um diferencial uma escola se preocupar não só com a adequação do aluno ao que a sociedade espera, mas oferecer meios para que este aluno tenha forças também para transformar a sociedade que o rodeia na busca de um bem estar físico em um mundo melhor.